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Projeto avalia potencial de manguezais para captura de carbono

  • Foto do escritor: Márcio Leal
    Márcio Leal
  • 22 de abr.
  • 5 min de leitura
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Os manguezais, reconhecidos como um dos ecossistemas mais eficientes na captura de carbono, desempenham um papel crucial na remoção de gases de efeito estufa e na mitigação das mudanças climáticas.


Para aprofundar o conhecimento sobre seu potencial de sequestro de carbono e sua importância ambiental, o projeto BlueShore - Florestas de Carbono Azul para mitigação de mudanças climáticas offshore - busca dimensionar e avaliar a capacidade dessas florestas ao longo da costa brasileira, contribuindo com estratégias globais de preservação e recuperação.


O Brasil é o segundo país com maior área de florestas de manguezais no mundo, cobrindo cerca de 1 milhão de hectares. O foco do projeto desenvolvido pelo Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI – Research Centre for Greenhouse Gas Innovation) é estudar as condições variadas desses ecossistemas ao longo da extensa costa brasileira, que se estendem do sul do país até o Amapá. Essas condições, especialmente as dos solos, influenciam diretamente a capacidade de captura de carbono dos manguezais.


"Nosso principal objetivo é calcular com precisão o potencial de captura de carbono e criar um banco de dados que preencha as lacunas de informação em diversas regiões. Para isso, estamos percorrendo todo o litoral brasileiro, coletando dados detalhados sobre diferentes cenários climáticos e geomorfológicos", explica Tiago Osório Ferreira, coordenador do projeto e professor do Departamento de Ciência do Solo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP).


"As florestas de manguezais têm o potencial de capturar de três a cinco vezes mais carbono por hectare do que a Floresta Amazônica", destaca Ferreira. "Além disso, os manguezais oferecem diversos outros serviços ecossistêmicos, como a proteção costeira contra a erosão e a provisão de habitats para diversas espécies marinhas."


O projeto também busca identificar os impactos ambientais causados pela mudança do uso da terra ao longo das últimas décadas, as quais variam conforme a região. Por exemplo, no Norte do Brasil, a criação de pastagens para agropecuária afeta os manguezais, enquanto no Nordeste o cultivo de camarão é o principal impacto e no Sudeste, a urbanização.


Entre os objetivos específicos do BlueShore está o estudo dos mecanismos de sequestro e estabilização de carbono nos solos, onde mais de 80% do carbono sequestrado pelos manguezais está armazenado.


O projeto também pretende criar um índice de saúde do solo para classificar regiões mais ou menos degradadas, além de analisar como a biodiversidade dos manguezais responde a maiores concentrações de CO2, e estudar as oportunidades para integrar esses ecossistemas no mercado de créditos de carbono.


"Precisamos entender como essas mudanças afetam o estoque de carbono para, no futuro, desenvolvermos estratégias de recuperação adequadas a cada tipo de solo, maximizando sua capacidade de sequestrar carbono", afirma o professor.


Robusto, mas não invencível


Os manguezais são um dos ecossistemas mais eficientes na captura de carbono. O consenso científico aponta que essa capacidade está relacionada às condições geoquímicas distintas dos solos dos manguezais.


"Por serem ecossistemas sujeitos ao alagamento, os solos de manguezais têm uma menor concentração de oxigênio, o que reduz a respiração de microrganismos e favorece o acúmulo de carbono no solo. Além disso, os diferentes tipos e formas químicas de minerais no solo influenciam a captura de carbono, o que varia de uma região para outra", explica Rodolfo Fagundes Costa, pesquisador do projeto e doutorando em Solos e Nutrição de Plantas pela RGCI/Esalq-USP.


Embora sejam extremamente resilientes e capazes de se desenvolver em condições de baixa oxigenação e alta salinidade, os manguezais não são invulneráveis. A ação humana, como a conversão de áreas de mangue em pastagens, por exemplo, compromete sua recuperação natural.


"Eles se adaptam com facilidade a diversas circunstâncias, mas não são invencíveis, principalmente por serem um ecossistema menos competitivo quando comparados à vegetação de outros ecossistemas. Isso faz com que eles não se expandam se margeados por vegetações mais competitivas, ficando reféns de outros ecossistemas, algo que pode ser visto quando as florestas de manguezais são convertidas em pasto", detalha Costa.


Além de sua importância na captura de carbono, a preservação dos manguezais é vital para geração de fonte de renda para diversas comunidades, bem como para a provisão de outros serviços ecossistêmicos, que transformados em valores monetários representam mais de US$ 90 mil por hectare por ano. "Precisamos proteger os manguezais não só pelo seu papel no meio ambiente, mas também pelo impacto econômico e social que eles representam para inúmeras famílias", conclui Ferreira.


Serviços ecossistêmicos


O armazenamento de carbono é apenas um dos muitos serviços ecossistêmicos e socioambientais prestados à humanidade pelos manguezais. Seu papel mais famoso, talvez, seja o de berçário da vida marinha.


Cientistas estimam que cerca de três quartos (entre 70% e 80%) das espécies marinhas de valor comercial para a pesca utilizam o manguezal em alguma fase do seu desenvolvimento (para procriar, se alimentar ou crescer) e, portanto, dependem desse ecossistema para sobreviver - mesmo que, no fim da linha, sejam pescadas muito longe dali.


"Não corte o mangue porque pode morrer a vida que tem dentro do mar", diz o refrão de uma música do educador Carlinhos de Tote, do grupo Cantarolama, em Maragogipe (BA), que há mais de quatro décadas trabalha pela preservação dos manguezais no Brasil.


Robalo, tainha e camarão-sete-barbas são alguns exemplos de espécies marinhas que se criam dentro do manguezal; além de tantas outras que podem não ter valor comercial para a pesca, mas são igualmente valiosíssimas para a saúde dos ecossistemas costeiros e marinhos. O gigantesco mero (Epinephelus itajara), uma espécie criticamente ameaçada de extinção no Brasil, por exemplo, passa os primeiros anos de vida no manguezal antes de migrar para o oceano na vida adulta.


Proteção


"Os grandes defensores dos manguezais hoje, sem dúvida, são as comunidades tradicionais organizadas", que entendem perfeitamente a importância desses ecossistemas, diz o professor Coelho Junior, da Universidade de Pernambuco (UPE).


Por isso a preservação dos manguezais é uma das principais bandeiras de gestão da Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais, a maior unidade de conservação marinha do Brasil, que se estende por 120 quilômetros entre o litoral Norte de Alagoas e Sul de Pernambuco, região onde Coelho Junior atua desde que concluiu a pós-graduação, em 2004.


Além de atuar como berçários, os manguezais funcionam como um filtro biológico, bloqueando a passagem de sedimentos e poluentes oriundos do continente que, se chegassem ao mar, poderiam comprometer a saúde dos ecossistemas recifais marinhos.


Outro patrimônio socioambiental que pode ser colocado em risco pelas mudanças climáticas é a cata do caranguejo, uma das atividades mais icônicas, tradicionais, culturalmente e economicamente importantes associadas aos manguezais. Duas das principais espécies que são alvo desse tipo de pescaria - o guaiamum (Cardisoma guanhumi) e o caranguejo-uçá (Ucides cordatus) - dependem das áreas mais internas e menos inundadas dos manguezais para viver e se reproduzir.


O guaiamum é uma espécie ameaçada de extinção no Brasil, que vive justamente nessa zona de transição entre as florestas alagadas de mangue e a terra firme, onde ocorrem os chamados apicuns, ou planícies hipersalinas, que são parte do ecossistema manguezal, mas são inundadas pela maré com menos frequência e não comportam vegetação de grande porte. São áreas cobiçadas para a construção de tanques de camarão e produção de sal, entre outros empreendimentos.


Já o caranguejo-uçá vive na lama dos bosques de mangue, mas também utiliza essas zonas de transição mais secas como berçários, segundo o biólogo Anders Schmidt, professor da Universidade Federal do Sul da Bahia e coordenador da Rede de Monitoramento de Andadas Reprodutivas de Caranguejos. "É lá que a gente encontra os filhotes de caranguejo, os indivíduos que estão chegando na população."


Com a elevação do nível do mar, a tendência é que esses apicuns se transformem em florestas de mangue e que essa zona de transição mais seca se desloque em direção à terra firme, onde o risco de bater de frente com construções humanas e acabar desaparecendo é enorme. "Não tendo esse backup de deslocamento você pode acabar perdendo essas zonas pouco inundadas, que é onde se renova a população de caranguejo", completa Schmidt. "É uma área extremamente crítica para a sobrevivência dessas espécies."


Texto editado a partir de matérias publicadas no Jornal da USP em 18/02/2025 e 16/12/2022.

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